Recentemente o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) esteve no olho do furacão em escândalos, corrupções e falcatruas
envolvendo o governo brasileiro, ao deturpar seu objetivo precípuo, que é
financiar o “indivíduo moralmente produtivo” (esta é uma das finalidades do uso
do dinheiro – mas existem outras formas). Geralmente indicado para aquele
empreendedor que necessita de aporte financeiro para alavancar seu negócio. Mas
quem deve avaliar este pedido de empréstimo? O banqueiro? O Estado? O mercado?
O amigo conhecido? Ou o Conselho Cultural do Brasil (CCB), proposta deste
texto?
Em primeiro lugar é preciso entender para quê serve o banco? O Banco foi
criação dos Templários, ordem religiosa cristã guerreira medieval (1119 –
1312), que nasceu como “banca” na praça das feiras e servia para “troca”
(cambiare) de dinheiro e transações financeiras, na qual os banqueiros
avaliavam, pesavam e trocavam muitas espécies de moedas. Podiam-se: negociar,
pedir empréstimos, pagar dívidas, adquirir letras de crédito e de câmbio, nota
promissória etc. E esse objetivo continua até hoje, alicerçado no “bom
costume”.
Em segundo lugar, é preciso entender o que significa “capital”. Este
resulta da síntese entre o espírito empreendedor humano e o terreno onde ele
trabalha. Com ele se pode fazer o que se quiser no mundo. É preciso, no
entanto, considerar as três formas do dinheiro: de compra, de investimento e de
doação. O dinheiro de compra pertence à vida econômica, pois se pode com ele
adquirir e trocar bens. Corresponde ao lado egoísta normal, quando se refere à
condição física de subsistência: alimentação, moradia, aluguel, vestuário,
colégio das crianças, pagamento de viagens e de consultas etc. Com relação ao
dinheiro de investimento, corresponde a poupança e empréstimos. Nesse caso é
necessário efetivar uma relação de direito, com um documento pormenorizado do
tempo de poupança ou de uso de empréstimo, dos juros, da forma de retorno etc.
A terceira forma do dinheiro é a doação. Poderia surgir a argumentação de que o
imposto ao Estado já é uma forma (compulsória) de doação e nesse caso não se
precisaria mais “doar” para outras iniciativas. No entanto é preciso entender
este aspecto a partir da sua origem. É preciso entender que o capital surge em
decorrência da capacidade humana; e nesse sentido seria lógico que os
excedentes da produção (os lucros) fossem direcionados de volta à vida
cultural, para patrocinar: ensino, pesquisa, artes, cultura, saúde, religião
etc. Assim se estaria cumprindo a máxima steineriana, como Lei Social
Principal: “O bem-estar das pessoas que trabalham em conjunto é tanto maior
quanto menos o indivíduo exigir para si os resultados de seu trabalho, ou seja,
quanto mais ele ceder estes resultados aos seus colaboradores e quanto mais as
suas necessidades forem satisfeitas, não pelo seu próprio trabalho, mas pelo
dos outros”. Por isso, as “doações” são as verdadeiras impulsionadoras das
iniciativas, sejam elas beneficentes ou culturais. Com essa atitude a Vida
Cultural “livre” pode se desenvolver, pois necessita que o “indivíduo” se
desenvolva livremente. Portanto, resumindo, o esquema abaixo mostra como as
três formas de dinheiro são possíveis de se realizar: dinheiro de compra tem a
ver com a vida econômica, dinheiro de investimento tem a ver com a questão
jurídica e dinheiro de doação com a vida cultural.
Dentro desta segunda pergunta cabe um questionamento: o que significa
ter capital livre, do qual tenha desaparecido o trabalho? É um capital
acumulativo ou “capital devedor”, que pode se tornar um “capital de
empréstimo”, para se tornar, por meio do espírito criador humano, “capital
produtivo”. A isso Steiner denomina circulação de capital e é o mesmo processo
que ocorre no “sangue humano”. Este, ao percorrer os pequenos vasos sangüíneos
(capilares), “caminha sozinho”. Mas quando o sangue cai na gravidade (nos
grandes vasos), começa a parar. É preciso que uma “força propulsora” imprima
novamente maior “velocidade” e isso é realizado pelo coração. Esta é a função
do Banco. Além disso, antes de devolver o sangue ao corpo, o que o coração faz?
Encaminha o sangue ao pulmão, para ser “oxigenado”, isto é, para o sangue ficar
novo. O mesmo se observa no caso de certa quantidade de dinheiro ficar guardada
em casa: ele envelhece (por ter ficado fora do circuito econômico). Precisa ser
“revitalizado” pelo Banco, para se transformar em “dinheiro novo” e ser
colocado novamente na “circulação”. Assim o seu “poder de compra” aumenta. E é
isso praticamente o que o banco faz.
Em terceiro lugar, quem deveria controlar o uso do dinheiro para
empréstimo e doação? Deveria ser colocado em mãos do Conselho Cultural do
Brasil (CCB), a ser criado pelo Congresso Nacional e ser instalado em Brasília,
junto com os demais poderes governamentais, com verba autônoma de custeio, para
pagamento de seus funcionários (estes poderão ser remanejados de outros
serviços públicos) e para serviços burocráticos, sendo que seus diretores não
serão remunerados, pois serão pessoas detentoras de ilibada reputação no âmbito
da sociedade, de reconhecida idoneidade moral que possam doar ou contribuir com
o organismo social saudável.
Finalizando, o CCB terá como
metas: fomentar a atividade cultural, a ciência, a educação, a de promover o
indivíduo na sociedade, a de integração internacional etc. O dinheiro, que é um
instrumento da vida espiritual no mundo, deverá ser usado com esse objetivo.
Para isso, será preciso criar um departamento específico dentro do Conselho
Cultural, no sentido de que o dinheiro cumpra o seu papel econômico, social e
individual. Esse departamento deverá ser o BNDES, como Banco social que já
cumpre essa missão. Os seus recursos (capital) poderão vir da vida produtiva,
desde que os industriais considerem essa medida mais humana e ecológica, numa
nova ordem social. Quando um interessado em começar um empreendimento e
precisar de recursos financeiros, o CCB (administrador do dinheiro) analisará
se tal empréstimo tem cabimento, o prazo de retorno do dinheiro etc. E em caso
de retornar o capital, este poderia ser reinvestido na empresa. Em caso de má
gestão, poderia inclusive se pensar em trocar o administrador ou a diretoria;
ou em caso do falecimento do titular, um herdeiro capacitado poderia levar em
frente o empreendimento; ou, em caso negativo, deveria se procurar outro
administrador. Desde que o empreendimento seja um bem necessário à sociedade,
deveria se buscar meios para que a empresa continue. Nunca os bens alienados
devem ser incorporados à vida estatal, pois esta não é a sua função.
Urge, hoje em dia, esclarecer melhor os limites e as interpenetrações
dos três sistemas do organismo social. A vida econômica deveria ser regida
pelas associações econômicas (entre produtor – comerciante – consumidor), a
questão da terra (agrária) pela vida jurídica e a questão do dinheiro pela vida
cultural – pelo Conselho Cultural do Brasil (CCB).
Antonio Marques
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