domingo, 9 de agosto de 2020

MEMÓRIA III


A iniciação no antigo Egito, nos templos de Ísis, visava “re-memorar” a grande façanha dos seres espirituais que construíram o Universo. O neófito era submetido a um processo de “quase-morte”, por três dias num sarcófago (assim como Lázaro fez), numa viagem espiritual até o começo da formação do Cosmo — era uma iniciação retrógrada, que caminha para trás, dentro da “memória” das hierarquias. Em sânscrito (antiga língua hindu) é conhecido como Crônica do Akasha (registro ou livro espiritual).

Para lograr êxito, era preciso sair da “temporalidade”, onde imperam o espaço e a matéria - e adentrar-se no âmbito da “eternidade”, do divino. Qual era o objetivo? Como Platão dizia: “conhecer o Pai da criação é um grande mérito” — e desejo de todo grande cientista, diria eu. Servia para conhecer os segredos do Cosmo e como o ser humano foi “fabricado”.

Segundo Platão, para “fabricar” o universo, foi preciso primeiro subjugar a “chôra” (fala-se côra), a substancialidade primitiva do Cosmo — a 5ª essência (quintessência), o éter cósmico ou etérico periférico (a “substância escura” da Física Quântica), da qual se consubstancializou tudo o que foi criado. Desse etérico primordial deu origem aos 4 éteres (fogo - ar - água - terra) para construir o universo.

Dessa maneira os Elohim (seres de luz, da 2ª hierarquia) espargiram sua luz para fora e arrastou a substancialidade sutil para a periferia cósmica; e o que era “pesado”, denso, que é a materialidade, afundou para o “abismo” (Apocalipse) para criar o “centro” do Universo — que é aqui na Terra com sua lua e outros planetas sólidos.

Já no período grego, o ser humano não mais se interessava em perscrutar os planos divinos, a iniciação “recordativa” não era mais realizada; pois “era preferível ser um vagabundo no reino dos vivos, do que um príncipe no Hades”. Mas havia um temor pelas manifestações dos deuses. O que chegaram para nós foram lendas, mitos, sagas, epopéias etc, como lembranças de tempos “imemoriais”, que dizem muito (simbolicamente) sobre a origem humana.

Ovídio, na sua “Metamorfose”, traz uma passagem sobre a deusa da inveja (Livro II, versículo 760), que vive numa caverna escura e úmida e se alimenta de cobras. Atenas fica na frente da caverna, na qual não tem permissão de entrar e dá à inveja a tarefa de envenenar os seres humanos — por isso se conhece o termo: “matar de inveja”.

Schiller também faz referência n’ “O anel de Policratos” - rei da ilha de Samos, Polícrates, relata a inveja dos deuses no período grego: “temo a inveja dos deuses”. Como deve ser entendido essa inveja ou essa maldição dos deuses nos tempos atuais?

Steiner enfatiza que nos Mistérios Egípcios o “princípio férrico” ainda se aplica hoje: “ou o espírito é compreendido ou se instala o caos” (GA 177, de 29.9.17). Ele dá o exemplo da I Guerra Mundial como consequência do tecnicismo e enriquecimento humanos do séc. XIX. Ele afirma que as almas dos falecidos que carregavam a tendência materialista “anseiam por forças destrutivas a partir do mundo espiritual (....) Tome isso como egoísmo, como egoísmo dos espíritos; mas os espíritos se vingam se forem ignorados. É uma lei, uma necessidade de ferro: os espíritos se vingam (... ) a vingança dos espíritos por ignora-los por tanto tempo é o caos atual da humanidade”.

Poderíamos dizer que pandemias e desastres naturais são decorrentes de deslizes humanos, por termos esquecidos nossa origem divina. Nesse caso, inveja dos deuses ou maldição dos deuses é o reflexo de nossas próprias fraquezas e imperfeições. Se não despertarmos (em vida) para a realidade espiritual, após a nossa morte, aumentaremos as forças de destruição a partir do mundo espiritual.

Portanto, as hierarquias vivem na memória da criação divina e por causa disso caminham para trás; e precisam ser lembradas (ou cultuadas), como foi falado acima. Por isso, ‘assim dizia Zaratustra’: “bons pensamentos, boas palavras e boas ações, alimentam as hierarquias” — e recebemos Delas saúde e força para mudar o mundo. Além disso, três rituais diários precisamos fazer: “meditar” (pensar o próprio pensar), “rezar” o Pai Nosso e fazer a “Retrospectiva” do dia antes de dormir.

Somente nós humanos caminhamos para frente, para o futuro. E o grande perigo que ronda o universo: a “luz” que foi usada para criar o Cosmo está se esgotando e está virando “treva”. E o futuro depende de nós humanos — porque nós seremos os criadores ou “fabricantes” de novos universos — Nova Jerusalém (ou Júpiter).

Precisamos nos transformar em “seres moralmente produtivos”. Assim mudaremos o mundo.


Antonio Marques

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