domingo, 9 de agosto de 2020

MERCOSUL – UNIÃO EUROPÉIA



Finalmente, depois de 20 anos, foi assinado o acordo comercial Mercosul-EU no G20, em Osaka – Japão; encontro de chefes de Estados e ministros de finanças das 19 maiores economias do mundo mais a União Européia. Finalmente o Brasil começou a andar para frente – e a proposta inovadora que se espera será a criação da moeda única “Peso-Real” para o Mercosul, a exemplo do “Dólar” para o Hemisfério Norte e o “Euro” para o Mercado Comum Europeu.

Esta era uma das propostas do historiador econômico inglês Christopher Budd, editor das obras econômicas de Rudolf Steiner (Sussex – England), que veio me visitar porque queria saber quem aqui no Brasil falava de Keynes (vide abaixo). Aproveitei a vinda dele para uma palestra aos alunos e professores de Economia na Faculdade de Economia da UFJF, no dia 13.11.98. Sua proposta é “realizar uma metamorfose gradativa do neoliberalismo em uma atitude pós-pós-moderna”. Para isso é preciso “considerar o dinheiro como reflexo da atividade humana” (conforme suas palavras); ou seja, a “produção” é mais importante e o “dinheiro” é a conseqüência normal. Ainda nesse aspecto, deve-se considerar o dinheiro como “unidade de conta”, com objetivo contábil. Nesse caso, o “lucro normal auto-sustentado” deve ser direcionado de novo à produção e o “super-lucro especulativo de risco-zero” deve ser canalizado para a educação e a saúde. 

Essas propostas não são realizadas hoje em dia porque foi implantado o Plano White (FMI = Fundo Monetário Internacional), norte-americano em Bretton Woods (1945), para a recuperação da economia no pós-guerra, em detrimento ao Plano ICU (International Clearing Union ou Câmara de Compensação Internacional), do economista britânico John Maynard Keynes (1883 – 1946). O que este propunha?  

Ele “criava uma espécie de Banco Internacional sui generis para as transações de comércio no pós-guerra, a fim de realizar o equilíbrio automático no balanço de pagamentos das nações participantes. Essa Câmara (ou Banco Mundial) podia dispensar seus membros de qualquer depósito em ouro, dólar ou outra moeda. Ao contrário, ela criava uma nova moeda internacional (de natureza escritural), denominada Bancor, a ser creditada (como doação) nas contas dos Bancos Centrais dos países participantes, em cotas diferentes (mutantes) segundo o volume de comércio exterior de cada um. A maior originalidade do plano estava, entretanto, na sugestão de se aplicar um tributo sobre os países credores e devedores sendo que o dos primeiros seria uma espécie de juro negativo, a fim de compeli-los a utilizar seus Bancors na compra de produtos das nações devedoras, tornando assim compulsória a participação dos credores no ajuste ao equilíbrio” (Fernandes, S. A libertação econômica do mundo pelo esquecido plano Keynes. Rio de Janeiro: Nórdica, 1991. p.128-9).

No entanto, por motivos espúrios, o Plano Keynes foi execrado do mundo “economês” moderno e nem seus enunciados são conhecidos. No entanto Keynes só é viável para um mundo humanizado, muito distante do que estamos vivendo – num mundo polarizado entre “esquerda – direita” ou entre hipertrofia estatal e imperium econômico. Não se reconhece o ser humano como figura principal deste organismo social. Ele apenas é usado como “produto descartável”. Assume-se profundamente a vida moderna, mas se esquece que, por detrás de tudo, está o espírito realizador humano. No entanto, precisa-se dar uma guinada nessa visão simplória e reconhecer que “o ser humano é o centro de tudo”. Primeiro ele precisa se desenvolver pela Educação, para o crescimento interior ético (virtudes). Em segundo lugar ele necessita da Cultura, para o desenvolvimento moral (para viver na sociedade). Ou seja, para se tornar um ser moralmente produtivo, é preciso a conquista do individualismo ético.

Atualmente, apenas a vida cultural não existe como realidade institucionalizada. Apesar de esse membro social estar presente desde o início da humanidade, na forma de Religião, assume hoje uma postura (inconsciente) como detentora da cultura, da arte, da educação, da ciência. Isso ocorreu, porque os outros dois membros sociais adquiriram independência. Atualmente, ela está apenas servindo de norteadora da ética e da moral, numa forma “nebulosa” e inconsciente nas mentalidades das pessoas e nas instituições. No entanto, ela permeia os outros dois setores do organismo social, porque por detrás da vida “social” (política) e da vida “econômica” se encontra o espírito humano. O indivíduo é que foi se imiscuindo, numa forma de se realizar no mundo, através da política (viver em sociedade) e finalmente através do lidar com as coisas materiais (economia).  

Uma das metas do Conselho Cultural do Brasil (CCB) a ser criado em Brasília, como primeiro membro do organismo social, deverá ser a de fomentar as atividades culturais, a ciência, a educação, a de promover o indivíduo na sociedade, a de integração internacional etc. O dinheiro, que é um “instrumento da vida espiritual no mundo”, deverá ser usado com esse objetivo. (Existem três possibilidades do uso do dinheiro: de uso privativo, de investimento e de doação). Para isso, será preciso criar um Departamento específico, dentro desta instituição, no sentido de que o dinheiro cumpra o seu papel econômico, social e individual. Esse departamento deverá funcionar como Banco social (por isso o BNDES deveria fazer parte do CCB) no sentido de que se possam realizar duas das três finalidades do dinheiro: de empréstimo às iniciativas produtivas e de doação às iniciativas culturais e beneficentes. A “circulação do dinheiro”, que é uma função bancária, deverá ser entregue ao CCB, pois só ele é movido pelo “altruísmo”. Os seus recursos (capital) poderão vir da vida produtiva, desde que os industriais considerem essa medida mais humana e ecológica, numa nova ordem “humana / social / econômica”.

Cabe agora uma importante pergunta: o que significa ter capital livre, do qual tenha desaparecido o trabalho? É um capital acumulativo ou “capital devedor”, que pode se tornar um “capital de empréstimo”, para se tornar, por meio do espírito criador humano, “capital produtivo”. A isso Steiner denomina circulação de capital e é o mesmo processo que ocorre no “sangue humano”. Este, ao percorrer os pequenos vasos sangüíneos (capilares), “caminha sozinho”. Mas quando o sangue cai na gravidade (nos grandes vasos), começa a parar. É preciso que uma “força propulsora” imprima novamente maior “velocidade” e isso é realizado pelo coração. Esta é a função do Banco. Além disso, antes de devolver o sangue ao corpo, o que o coração faz? Encaminha o sangue ao pulmão, para ser “oxigenado”, isto é, para o sangue ficar novo. O mesmo se observa no caso de certa quantidade de dinheiro ficar guardada em casa: ele envelhece (por ter ficado fora do circuito econômico). Precisa ser “revitalizado” pelo Banco, para se transformar em “dinheiro novo” e ser colocado novamente na “circulação”. Assim o seu “poder de compra” aumenta. E é isso praticamente o que o banco faz. E os seus recursos (capital) poderão vir da vida produtiva, desde que os industriais considerem essa medida mais humana e ecológica, numa nova ordem social. Quando um interessado em começar um empreendimento e precisar de recursos financeiros, o CCB (administrador do dinheiro) analisará se tal empréstimo tem cabimento, o prazo de retorno do dinheiro etc. E em caso de retornar o capital, este poderia ser reinvestido na empresa. Em caso de má gestão, poderia inclusive se pensar em trocar o administrador ou a diretoria; ou em caso do falecimento do titular, um herdeiro capacitado poderia levar em frente o empreendimento; ou, em caso negativo, deveria se procurar outro administrador. Desde que o empreendimento seja um bem necessário à sociedade, deveria se buscar meios para que a empresa continue. Nunca os bens alienados devem ser incorporados à vida estatal, pois esta não é a sua função.

O Departamento de Banco Social deverá visar a “circulação do dinheiro”, no sentido de fomentar o capital de empréstimo e de doação, para aqueles que necessitam de meios para trabalhar economicamente no mundo e para a cultura, respectivamente. Portanto tanto a vida jurídica como a econômica precisam do “alimento” que vem da esfera do CCB, como foi amplamente comentado. No primeiro caso, precisa-se elaborar “leis” mais condizentes com a condição humana, que se fundamentem na vida do “direito”. No segundo caso, necessita-se da participação de pessoas com “juízo econômico”, que entendam da prática econômica, que possam fundar associações, para dar um rumo certo à “realização” do homem no mundo. Com relação à “circulação do dinheiro”, que é uma função bancária, deveria ser integrada ao CCB. Assim o dinheiro poderá assumir a sua verdadeira e específica função no mundo.

Neste nosso século deveríamos estar vivendo a trimembração social, mas repetimos velhas cantilenas bi-membradas (esquerda – direita). Se não abrirmos os olhos para a corrente histórica que perpassa as civilizações, algo de ruim pode advir como mostrado acima. Urge, hoje em dia, esclarecer melhor os limites e as interpenetrações dos três sistemas do organismo social; e resgatar o 1º membro do organismo social trimembrado – o CCB.  

Antonio Marques
Membro do CCB

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